quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Somos os Lírios do Campo


“A guerra deve ser em função da paz,
A atividade em função do ócio,
As coisas necessárias e úteis em função das belas” 
Aristóteles


Hoje, elegemos falar do bom e do melhor dessa vida! Nada de vazios, tédio ou melancolia. Queremos exaltar a força extraordinária, a vitalidade e potência criadora que irrompe em nós e faz o nosso sangue ferver. É preciso falar da alegria, do riso, das banalidades e do ridículo que há em nós. Necessitamos do cômico e do trágico; de Dionísio e de Apollo. Do barroco e do clássico. Gostamos e queremos brincar “bem na hora da explicação da tarefa de casa”.

Sabemos que muitas vezes a noção de trabalho está centrada na filosofia “no pain no gain”... nessa idolatria maluca e competitividade. No entanto, acreditamos que uma ‘produção eficiente’ não necessariamente está ligada ao tempo que você passa na farfúncia.

Pensamos ser possível trabalhar com alegria e divertimento... visando uma postura ética, “meta-humana” (ops!) objetivando distribuição equânime da riqueza, do trabalho, do saber e do poder. Confessamos nossa utopia (mas a confessamos juntamente com Thomas More).

Segundo o italiano Domenico De Masi “o futuro pertence a quem souber libertar-se da ideia tradicional do trabalho como obrigação ou dever e for capaz de apostar numa mistura de atividades, onde o trabalho se confundirá com o tempo livre, com o estudo e com o jogo, enfim, com o ‘ócio criativo’ ”.

E se a delícia da vida mora na sagacidade do humor, no prazer de fazer o que se ama, na capacidade de canalizar esse vulcão... essa energia libidinal na produção laboral; na vocação de ser o que se faz e fazer o que se é... Esclareçam, por favor: por que cargas d’água exigem de nós tamanha seriedade e semblante!?

Ah esse suor que lhe escorre da testa... Quanto respeito ele denota!

– “Acabou a brincadeira!” Dizia a professora da Cristina quando queria inculcar em seu tímido cérebro as operações matemáticas.

E assim ela foi crescendo, engordando sua consciência com fantasmas, culpas e faltas. Aprendeu a disfarçar suas brincadeiras. Camuflou-as em buscas e inquietações. Agora, aos 50 anos, a alegria pulsa, sem constrangimentos! O júbilo está ao seu alcance, por boa parte do tempo. Seu corpo lê seus acordes, dança, canta, e junto, a língua se poetiza. As moléculas se agitam. Sente os sopros dessa delícia saltando pela pele e endoidece em festa com os amigos, com os amores.

Carolina conta que em seu tempo de “lápis e carteira” não existia a nomenclatura tão usual atualmente: bulliyng. Bem... não existia a nomenclatura, mas as práticas... essas sim! E a freguesia mais assídua eram as professoras e diretoras, que dotadas de uma perversidade ímpar, rezavam a cartilha do sistema educacional da época.. aquele tradicional, autoritário, religioso, prussiano, capitalista e sanafobitch.

- “Licença, professora... preciso ir ao banheiro”, a menina pergunta diante de toda a sala de aula.

- “Vai fazer o que no banheiro? Preciso decidir o tamanho do papel higiênico!”

Pois é... Bem sabemos quão alegrinhas e desavisadas as criancinhas podem ser. Tenho certeza de que nenhum de nossos alunos escutaria inerte, resposta tão grotesca. Nenhum professor de nossa Aldeia sairia ileso caso quisesse colocar suas insatisfações no lugar errado.

Essa liberdade é uma conquista. E é gradativa! Quanto antes proporcionarmos a possibilidade de liberdade às nossas crianças, tanto melhor! Mais inteligentes serão!

Quantos ‘haveres’ e ‘afazeres’ deixamos de assenhorar por conta das expectativas de outrem, de conceitos morais que renegam o bem comum, o amor e a alegria. Grandes e altas vozes, vindas do passado, se tornam a nossa própria voz para dizer o certo e o errado, o bem e o mal. Ah, felizes aqueles que conseguem uma voz interior que canta músicas festivas e declama poemas de amor.

Essa liberdade vivemos em viagens, leituras, amizades, e pasmem: no trabalho! Sim... vivemos liberdades nesse lugar de ‘oferecimento de belezas’. Nos entregamos e topamos o desafio da vida e fizemos do trabalho, um caminho, uma saída... a sublimação nossa de cada dia. O sinthoma. Uma das nobres possibilidade de elaboração das loucuras.

Bem sabemos que ainda muitos discursos ressoam em arquétipos que tem o trabalho como algo repleto de regras rígidas e sóbrias. São infinitos os absurdos organizacionais, mas não em nossa “Aldeia”, não em nosso quadrado. Divertimo-nos no que fazemos, sem antagonismos. Há uma harmonia de fazeres e deleites entre o acordar às cinco ou seis da manhã e as boas noites de sono.

Somos cúmplices de De Masi e não pregamos vagabundagem! Aliás, vivemos em desacordos com alguns indolentes parasitas que dedicam o seu tempo em desperdícios para a nossa sociedade. Mas se nos perguntarem se já vadiamos, se já jogamos tempo fora, imediatamente te convidaremos para uma cantoria animada... ou quem sabe para uma desajeitada dancinha pélvica regada ao som de Sidney Magal!


Esse foi laborado a quatro mãos e ‘performatizado’ a incontáveis gargalhadas!


Pensar a produção como prazer é uma inovação existencial e não simplesmente logística. É importante que em toda atividade esteja presente a criação de um valor, mas juntamente com isso, o divertimento e formação. Isso é ócio criativo!

E dizemos mais... essa observação empírica de que falamos aqui, já era há muito uma verdade bíblica. Vejamos: “aprendei dos lírios do campo, que não trabalham nem fiam. E, no entanto, eu vos asseguro que nem Salomão, em toda sua glória, se vestiu como um deles”.




Carolina Parrode e Cristina Moraes, 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

A Liturgia Extraordinária

Domingo. Almoço de família. Todos ali, de mamando à caducando. Amigos e seus pares – recentes e antigos... todos, enfim! O ambiente não estava tão divertido e carecia de uma animação. Foi então que decidi pedir ajuda ao meu querido. Ele estava plácido ali na biblioteca...

- Carlos!

Ele veio silente... chegou até mim com sua usual inteligência, humor, perspicácia e fina retórica.

É claro que “O Amor Natural” talvez não seja a escolha mais adequada para um pequeno recital no almoço de domingo... Mas confesso que a experiência foi, no mínimo, divertida! Aliás, falar de sexo em meio aos humanos, sempre é!

O que Drummond faz em “O Amor Natural”, nos cora as bochechas diante do avô, mas também nos anima e nos recoloca. Juntamente com o poeta, admitimos uma derrota diante das consumições eróticas. Porque é bom ler Drummond, de qualquer jeito e em qualquer ocasião!


E bem sabe quem me escutou naquela tarde: o que mais houvesse para acontecer na cama entre homens e mulheres, estava lá... escancarada na poesia. Como pode!? Aquele velhinho tão terno, tão respeitável!

Pois é, mas sem deixar nossa perspicácia ser embaçada pela óbvia timidez mineira drummondiana, bem sabemos que Carlos já cultivava o erotismo desde sempre! Aquele humor, aquela ironia, a inteligência, a paixão!

E assim transcorreu nosso ordinário almoço de domingo... Drummond rendendo-se a sua inusitada produção de poemas e os comensais rendidos... entregues à degustação de seus escritos... passeamos todos de mãos dadas entre o erotismo, a concupiscência e a carnalidade, em completo despudoramento dominical.


AMOR — POIS QUE É
PALAVRA ESSENCIAL


Amor — pois que é palavra essencial
comece esta canção e toda a envolva.
Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,
reúna alma e desejo, membro e vulva.



Quem ousará dizer que ele é só alma?
Quem não sente no corpo a alma expandir-se
até desabrochar em puro grito
de orgasmo, num instante de infinito?



O corpo noutro corpo entrelaçado,
fundido, dissolvido, volta à origem
dos seres, que Platão viu contemplados:
é um, perfeito em dois; são dois em um.



Integração na cama ou já no cosmo?
Onde termina o quarto e chega aos astros?
Que força em nossos flancos nos transporta
a essa extrema região, etérea, eterna?



Ao delicioso toque do clitóris,
já tudo se transforma, num relâmpago.
Em pequenino ponto desse corpo,
a fonte, o fogo, o mel se concentraram.



Vai a penetração rompendo nuvens
e devassando sóis tão fulgurantes
que nunca a vista humana os suportara,
mas, varado de luz, o coito segue.



E prossegue e se espraia de tal sorte
que, além de nós, além da própria vida,
como ativa abstração que se faz carne,
a ideia de gozar está gozando.



E num sofrer de gozo entre palavras,
menos que isto, sons, arquejos, ais,
um só espasmo em nós atinge o clímax:
é quando o amor morre de amor, divino.



Quantas vezes morremos um no outro,
no úmido subterrâneo da vagina,
nessa morte mais suave do que o sono:
a pausa dos sentidos, satisfeita.


Então a paz se instaura. A paz dos deuses,
estendidos na cama, qual estátuas
vestidas de suor, agradecendo
o que a um deus acrescenta o amor terrestre.


(do livro: O Amor Natural. autor: Carlos Drummond de Andrade. editora: Record.) 














Carolina Parrode, amante.




Caro(a) leitor(a), suponhamos que se chegou até aqui, se degustou, com e como nós, os escritos de Drummond, certamente algo te acalora. Se assim for, que bom! Não resfrie. Ouça:  


quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

O roteiro da vida real



O que é exatamente uma ausência? Drummond em um dos meus poemas favoritos disse:
“Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim.
[...] e essa ausência assimilada
ninguém a rouba mais de mim...” 
Com alguma frequência, assisto meninos crescerem entre ausências. Crianças que na idade adulta, ainda estarão na infância reclamando o amor que lhes faltou quando eram pequenas. E mantem-se assim, até o momento em que aprendem a encontrar a satisfação, o desfastio e a alegria nelas e por elas mesmas.

Dia desses, no cinema, me deparei com o cineasta russo Andrey Zvyagintsev, em Loveless, um dos fortes candidatos ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Longa que expõe a aspereza, a dor e os vazios da falta de amor. No início da trama, um menino brinca com uma fita de isolamento que traduz seu exílio. Entre ele e seus pais, grandes abismos e nenhum espaço para o afeto. O amor e a atenção estão direcionados para outras pessoas, outras necessidades. E dentro deste cenário gélido, desértico, visitei a menina que fui, lembrei-me das meninas que fiz nascer e de tantos outros que considero meus.

Cena do filme Loveless

Crianças e suas mágoas, suas dores e hematomas. Já dizia o poeta que “nascer é abrir-se em feridas.” Machucados que se fazem à mercê do desejo dos pais e, principalmente, os que contém a sua autoria. Sim, porque eu, enquanto mãe, entre tantos não saberes, tenho certeza que todas as minhas faltas provocaram outras tantas em minhas filhas.


Me culpar e chorar os buracos, nada resolve e nem auxilia consolos. A procura por culpados diante do adoecimento de uma criança é inoportuna, isso porque, pais e filhos são dinamicamente participantes e compartilham de ressonâncias do que chamamos vida, em um elo de infortúnios que se repete por gerações. Para ferir com instrumento cortante essa conexão, tudo o que me esforço em fazer é assumir minhas responsabilidades incorporadas a essa linha geracional, na consciência do meu melhor, na lucidez e remissão das feridas que se abriram na minha infância e na minha capacidade de amor.


Ausência e presença são episódios de qualquer vida humana desde que nascemos. A elaboração da angústia do que nos falta é aprendida nos espaços de aparecimento e desaparecimento de pessoas e haveres. O bebê afasta-se do útero e se projeta momentaneamente num espaço vazio, até o desejado encontro com a mãe e o acolhimento em seu amor. É nesse tempo-espaço de ausências que começamos a elaborar a faculdade de estar sozinho. Os bebês adoram quando os pais brincam de fazer coisas desaparecerem. Jogo que divertia muito a mim e as minhas filhas. É o início de um envolvimento com a nossa solitude, que mais tarde se transforma numa experiência de saber ficar só, consigo mesmo.


Ordinariamente os pais têm dificuldade de sustentar as ausências dos seus filhos. Ausências não podem ser confundidas com abandono, como no caso do filme russo Loveless. Estas ocorrem quando os pais sustentam a possibilidade de seus filhos descobrirem outros amores e experimentarem a vida para além deles. A criança que é autorizada pelos seus pais, é tomada na sua competência de provar da vida para além do visível. É a capacidade de encontro com os nossos vazios, medos e dores, e sabermos que ainda há vida. Puti!!!



Precisamos encontrar nossas ausências rastreando o estar “em mim”. É esse o bálsamo capaz de cicatrizar minhas chagas pela vida afora. É essa a fragrância para o corpo e para a alma das minhas filhas, o oásis dos meus meninos e para todas as crianças escondidas em nós.

Cristina Moraes, espectadora protagonista.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Panem et Circenses


Nesse Carnaval, Cristina e Carol escolheram caminhar para ali, bem na esquina... para a Capital Federal! Esse lugar que já foi o lar de Carol em tempos remotos... Brasília! Cidade com ar diferente... com cheiro de nostalgia e que desperta a vontade de raciocinar.




Brasília, apesar de seus traços retos e tantos planejamentos urbanísticos, me inspira LIBERDADE. É como se fosse o casamento de um virginiano com uma sagitariana convicta... um paradoxo que por vezes é harmônico... outras tantas, conflituoso.

Mas enfim... é Carnaval! É a festa do povo, é a festa da carne. Independentemente se o folião é de rua ou de netflix, o fato é que o Brasil pára e todos aproveitam o feriado seja para descansar, farrear, organizar as gavetas ou simplesmente fazer o que quiser no horário que quiser.




A expressão panem et circenses advém do período de dominação romana e era o modo com o qual os líderes romanos lidavam com a população em geral, para mantê-la fiel à ordem estabelecida e conquistar o seu apoio. Esta frase originou-se a partir do humorista e poeta romano Juvenal e no seu contexto original, criticava a falta de informação do povo romano, que não tinha qualquer interesse em assuntos políticos, e só se preocupava com o alimento e o divertimento.

Assim, nos tempos de crise, as autoridades acalmavam o povo com a construção de enormes arenas, nas quais realizavam sangrentos espetáculos envolvendo gladiadores, animais ferozes, acrobacias, bandas, espetáculos com palhaços, artistas de teatro e corridas de cavalo. Outro costume dos imperadores era a distribuição de cereais mensalmente no Pórtico de Minucius. Basicamente, estes “presentes” ao povo romano garantia que a plebe não morresse de fome e tampouco de aborrecimento. A vantagem de tal prática era que, ao mesmo tempo em que a população ficava contente e apaziguada, a popularidade do imperador entre os mais humildes ficava consolidada.
E então?! Será que o Carnaval é a festa do “Pão e Circo” por excelência?! Talvez, o evento cultural não seja o problema e sim o modo como nós, brasileiros, encaramos nossas festividades culturais, incluindo a Copa do Mundo... etc. 

Certa vez aprendi com Bertolt Brecht que:
“o pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio depende das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce à prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo ”

Enfim, não vejo mal algum em brincar o Carnaval como se não houvesse amanhã... em fazer o que quiser, usufruir da liberdade que os tempos atuais sugerem. No entanto, é importante saber... ter a plena consciência sócio-histórica, para que não sejamos um povo feito apenas de festas, feriados e comemorações.

Passar o feriado em Brasília foi muito prazeroso... um Carnaval feito de comes, bebes, sorrisos, danças e cantorias. 



Revi amigos queridos,


 mostrei um pedacinho de mim para meus filhos


 e experimentei da nostalgia que é rever Brasília, em meio à sua fanfarra disfarçada de seriedade e à sua boemia travestida de intelectualidade.


sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Enfim... Feliz Ano Novo!

Dizem que o ano novo só começa após o carnaval... Well, o meu não!
2018 começou dia 1º mesmo... e veio com tudo.




Mas quem sabe posso utilizar o pretexto para uma retrospectiva intempestiva.. Vamos lá:
Retrospectiva 2017 de um jeitinho bem suave... vou até usar as palavras  do  Voltaire, que ilustra bem meu ano de 2017...
 "Gostaria de saber o que é pior: ser estuprada cem vezes por piratas, ter uma nádega cortada, passar pelas varetas dos búlgaros, ser chicoteado e enforcado num auto de fé, ser dissecado, remar na galé, sofrer enfim todas as misérias pelas quais passamos ou então ficar aqui, fazendo nada?" 
Em 2017 o marasmo mental e emocional passou longe e vivi  muito mais nas convulsões da inquietação, do que na letargia do tédio. Ano cheio de aprendizagens! Sou muito grata por cada momento, riso e lágrimas.

Estar feliz não é sorrir o tempo todo... E se sentir corajosa e pronta para enfrentar as surpresas da vida, é uma dádiva! A somatória das minhas experiências me fizeram mais mulher... muito mais!
Em 2017 estiveram diante de mim, meus piores medos... e fui, de forma muito benevolente, obrigada a lidar com o lado mais sombrio do meus sintomas (credo).



Quase todos os meus medos se concretizaram e eu estou aqui,  mais viva do que antes.
Realmente me sinto com mais vivacidade, mais capaz de amar, mais aberta, mais mulher, mais corajosa!



É claro que na memória longínqua, insiste um leve sabor amargo de algumas cicatrizes, mas sou goiana e aprendi com minha avó que o amargo da guariroba não suporta o doce da ambrosia. É só uma  questão de deixar por conta do tempo, da coragem, da fé... Sim, porque o tempo é curativo e sabe passar!  Passa melhor para quem quer pensar as feridas, para quem se dispõe na vida, com sabedoria e amor.


Carolina Parrode, sobrevivente (e feliz). 

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

O fazer de quem faz o impossível

Há uma longa discussão entre nós, que fazemos parte do corpo docente de uma Escola, sobre o distanciamento que existe entre o momento da elaboração das tarefas e a execução, com as crianças, em sala de aula. A equipe que elabora o material procura vislumbrar momentos lúdicos e prazerosos durante a execução das atividades em sala, pelo professor. Confesso que nem sempre esse anseio se realiza, e muitas vezes o que temos, são obstáculos no momento da transmissão do conhecimento. O que é normal, já que educar é um dos impossíveis da vida. Mas nem por isso deixamos de tentar com afinco, amor e beleza.


Bem, diante dos questionamentos contidos em nosso Projeto Arte, mais precisamente no item 3.2, nos deparamos com o desejo de contar muitas coisas aos meninos. Isso teve desdobramentos e uma bela colheita. Propusemos uma reflexão sobre o brincar, em comparação com o trabalho do adulto. E também sobre o amor e quão salutar o binômio freudiano pode ser na vida do ser humano.
Durante a execução da tarefa, me lembrei da inquietude de Dr. Freud em “Escritores Criativos e Devaneios” (1908) acerca da necessidade de uma investigação sobre a atividade de criação, fato que “nos daria a esperança de obter as primeiras explicações do trabalho criador do escritor”. Freud apercebe-se, contudo, que não seria jamais através da compreensão conscienciosa acerca dos fatores determinantes e da natureza da arte de criação que contribuirá para que qualquer um torne-se escritor criativo. Há algo além. O que está além? Daí chegamos em um lugar caro: a infância. Lá onde existem os primeiros traços da atividade imaginativa. Afinal, qual a importância do lúdico? Qual a importância do brincar?

 


Aprendi rápido que “a antítese do BRINCAR não é o que é SÉRIO, mas o que é REAL”. Penso que a brincadeira imaginativa da criança consiste na forma disponível de elaboração (‘elaborar’), ou meio de sublimação de seus conteúdos psíquicos. A necessidade infantil de transformar sua realidade psíquica em ’brincadeira’ é uma brilhante saída para sua sobrevivência psíquica e manutenção de saúde mental.

Acaso não poderíamos dizer que ao brincar toda criança se comporta como um escritor criativo?  📚😉


Carolina Parrode, Educadora.