quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Vários Amores, Uma Só Vida - Parte II


Toda demanda é uma demanda de amor
Jacques Lacan

Ella entrega seu corpo sobre a cama, cruzando os dedos apoiados no ventre... distrai-se com seus próprios pensamentos naquele palco.

Às 14h ele se aproxima, flagra-a em meio às distrações e a desperta de seus próprios devaneios. Ella, hesitante, arregala os olhos como quem tenta abarcar a realidade presente... distante de suas quimeras! A impressão que tinha é que seus pensamentos estavam gritando.

Foi então que surgiu a indagação: - "Você está apaixonada por outro homem?!" A resposta estava posta... essas coisas acontecem nos recônditos do matrimônio.

Mais de uma década juntos... Juan era seguro da autenticidade de seu relacionamento! Mas o que dizer dos pensamentos de Ella, que vagavam longe naqueles dias... Seus suspiros anônimos que divagavam em meio a desejos que ele jamais poderia alcançar. E apesar de sentir-se infernizado por essa ideia, nada havia que pudesse fazer. Ella tinha mente livre, que oportunizava outros mundos, não importando onde estivesse seu corpo.
Por onde andava os pensamentos de Ella? E o que conseguiu fazer deles?










Ella é uma mulher contemporânea. Poderia ser eu... ou você! Sabemos que essas histórias acontecem inclusive nas melhores ‘instituições’.

Quase dois séculos antes de Ella, em 1830, durante um jantar, o filósofo John Stuart Mill conheceu Harriet Taylor. Apaixonaram-se perdidamente. Entretanto, ela estava casada há quatro anos com um farmacêutico, John Taylor. O relacionamento se manteve na impossibilidade por muitos anos, até 1849. Os apaixonados se casaram dois anos depois em Paris.

Harriet teve grande influência na filosofia de Mill e contribuiu especialmente para seu feminismo liberal. Mill creditou a ela a coautoria de muitas de suas obras. Os dois trabalharam juntos nas ideias centrais do pensamento inovador do filósofo. Infelizmente Harriet morreu em 1858.

Pois então... biografias, ficções e até a vida real/atual/factual estão recheadas de histórias assim. O amor é uma linguagem que deve ser compartilhada pelas pessoas e como toda linguagem, é feita de códigos. O amor é um tema tão extenso que abarca praticamente todos os atos da nossa existência.

Então.. vamos falar de amor (esse - também - bonito, que acontece entre um homem e uma mulher)

Afinal, é possível atração erótica, intelectual e afetiva sem haver a entrega física, passional... carnal? De que falamos quando adentramos no terreno estranho do amor ‘proibido’ ou ‘interditado’? Que sentimento é esse, qual circunstancia é capaz de impedir um homem e uma mulher de se entregarem ao desejo de estar juntos... unidos... em toda a sua potência libidinal? É possível o inconsciente com sua atemporalidade, dinamicidade e regência pelo princípio do prazer, se curvar a esse tipo de (des)mando institucional da civilização? Se sim, a que custo?! Então... essas são perguntas que meus impedimentos e limitações fazem o tempo todo... e faço em silêncio.
Que não exista a ação... já que falamos aqui da maioria de nós, neuróticos adestrados. Mas o desejo... (é) chama! É incrível observar como o desejo movimenta os corpos. É puro movimento porque só desejamos aquilo que não temos, portanto, é a falta que instaura o circuito do desejo. 
Adoro a confissão de Sócrates diante dos comensais no banquete, quando diz “(...) pois confesso não entender de nada mais, senão de amor”. Por certo... tenho para mim que sem amor, a humanidade não poderia existir um só dia!

Embaraçada entre tantas reflexões inúteis, concluo timidamente que diante dos freios sociais que nos impedem de passar ao ato, talvez o que prevaleça seja o amor à verdade, vez ou outra, sobre tudo mais, inclusive sobre o amor ao amor. Se considerarmos a ‘verdade’ como continente da realidade... não sei  (pensamento inconcluso aqui).
Todavia, lembremos que desejos passionais são águas... águas sujeitas a tempestades e tsunamis vez ou outra!


Carolina Parrode, desejante e desejada.


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