Sou
realista. Não me entrego a paixões. Não;
não me apaixonei por você. E de modo algum eu te amei. Tudo isso, na verdade,
apenas um pouco; bem pouco.
Gostara
da lentidão tosca de sua barba a roçar meu pescoço, dela escorrer, lenta suave aspereza,
a picar frestas e talos de frêmitos;
trânsito até o cosmos que sonharás ainda entre minhas pernas. Apreciei provar a doçura de sua potência a
sobrevir, rija proa, em gozo de marés que eu desconhecia. Então, foi aprazível repousar
pela pele sua, corpo sobre corpo, algum suor entrelaçado, ofegante. Em que
medida chamejou em mim esse sono aconchegado, despercebido sobre as paragens do
seu peito?
Gostei,
então, e especialmente, das velas de sua mão a velejar por todo meu corpo. Frustrados,
assim, o tempo e as tentativas de assistir, inteiro, um filme ao seu lado.
Razoáveis
nossos risos. E o vinho a vazar as horas.
Seu
cheiro e anatomia caíram em meu agrado? Como se não houvesse saída, divertia-me,
muda, a fitar seus olhos – tão perto como as nuvens de nuances que eu percebia,
camaleão brincando conforme a luz.
Gostei
de conversar migalhas à mesa, pelo sofá, pela cama. Milagres da intimidade
tornavam tudo mais fácil, mais livre e delicioso.
Simplório
e déspota, agradou-me a servidão em seu jeito de me despir pelo olhar. Com
tanto entusiasmo contemplavas meu corpo que, nesse gesto mesmo, eu já estava
saciada. Límpida lascívia das retinas. E
eram olhos, lábios, mãos, língua e muito mais a me esquadrinhar.
Gostei
de imaginar-me nessa nova moldura de abismos, espelhos. Era bonito ver-me com
este adorno, esta voluta que foi você. Breve horizonte de eventos, paisagem.
Inventário
medíocre, é doce te utilizar, apetrecho, para pintar esta tela. Tua tinta
insuficiente. Que tesão tecer tais obscenidades. Orgasmo de olhar-me. Você. Em
mim.
Carolina Parrode, ficcionista em collab.